Este post faz parte de uma série de pesquisas para possíveis melhorias no acompanhamento de proposições legislativas. Embora nossa meta seja submeter o projeto ao LABHacker (Laboratório de Inovação Cidadã da Câmara dos Deputados), trata-se atualmente de uma iniciativa independente. As informações foram coletadas do site Dados Abertos e do Portal da Câmara, sendo utilizadas aqui em conformidade com os seus termos de uso.


O sistema da Câmara dos Deputados informa que o PL do Estatuto do Desarmamento (PL 3.722/12) está pronto para pauta no Plenário. O PL pretende modificar o Código Penal, além de revogar a Lei 10.826/03.

Por se tratar de um tema socialmente relevante e de amplo interesse, terminou por gerar uma tramitação bastante complexa. Prova disso é que o debate sobre o Estatuto do Desarmamento conta com diversos apensos.

A ficha de acompanhamento do mencionado PL informa, além de do link para download do inteiro teor, uma série de metadados:

Ficha de acompanhamento do PL 3.722/12

Ou seja, o principal documento da proposição é um arquivo em pdf. E, em torno dele, o que o site informa são seus atributos e sua linha do tempo, de tal modo que se o interessado realmente quiser saber o teor do PL, precisa abrir um documento estático e bastante "selado". Entretanto, essa não é a forma mais precisa de saber mais como se organiza a própria norma, hoje tratada como um texto fechado em seu suporte digital.

Nesse propósito, tivemos que iniciar o desenvolvimento de uma abordagem própria, centrada no principal documento da proposição, atualmente tratado como um anexo desse sistema de acompanhamento. Não é o caso de nos aprofundarmos esse ponto, mas é conveniente registrar que todos os sistemas que encontramos são do tipo CMS.

Em síntese, um CMS é uma ferramenta de carregamento de arquivos em diversos formatos, com baixo grau de detalhes e customização. Nós, ao contrário, somente temos interesse em um tipo de arquivo, cuja estrutura é muito particular. Nossa meta é criar uma ferramenta para interpretação dos impactos da proposição na legislação em vigor e isso exige fragmentar cada uma das normas envolvidas em suas unidades fundamentais. Somente assim será possível estruturar as ligações existente entre os fragmentos normativos.  

E aqui lembramos que a estrutura de uma norma (ou proposição) pode ser bastante complexa. Segue a ilustração da possível (e ainda incompleta)  organização de uma lei. Estamos cientes de que "norma" não é a denominação ideal, mas preferimos estipular algo que possa significar uma lei, um decreto, uma possível lei, etc. Ou seja, norma aqui é utilizada como uma denominação genérica para organização de qualquer texto que se enquadre no seguinte formato:

Possível estrutura de uma lei

Um dos obstáculos do projeto está em que, de acordo com os sistemas que organizam a atividade legislativa, o texto principal da proposição é acompanhado de uma série de outros documentos - geralmente também em formato pdf. A estrutura ilustrada existe apenas de forma subjacente, sendo reconstruída na cabeça do leitor a cada exercício de interpretação.

Ou seja, existe apenas um mapa mental da estrutura, mas que não é refletido nas ferramentas de consumo de conteúdo jurídico. Cada referência, assim como eventuais links, precisam ser mentalmente carregados "na cabeça do leitor", pois não existe uma ferramenta de navegação ideal para a tarefa.

É bem verdade que a existência de um acervo eletrônico de documentos com hiperlinks já é um avanço. Mas é verdade também que essa forma de estruturação já conta com várias décadas e começa a sentir "o peso da idade". Hoje o usuário demanda uma interação mais fluida e mais granular com o conteúdo.

O Google fez esse favor/desvafor: nenhum usuário mais admite ser educado.

Nesse cenário qualquer treinamento passou a ser dispensável e isso vale para praticamente qualquer usuário. O cidadão não quer entender um organograma ou estudar uma taxonomia antes de fazer sua pergunta. O servidor conhece o organograma e as taxonomias, mas exige uma experiência superior dos sistemas, pois ele já tem os melhores programas do mundo no seu celular. E o parlamentar, pelos mesmos motivos, está certamente mais exigente quanto à qualidade e urgência das pesquisas.

Retomando a descrição do sistema atual, segue o exemplo do relatório da legislação citada no PL, em formato pdf. Trata-se de um relatório com diversos links, contendo o endereço das normas potencialmente afetadas pelo PL, mas sem muita precisão nem indicação de qual parte do PL gerou o referido impacto:

Anexo ao PL 3.722/12

Como é possível notar, a malha legislativa é muito complexa e o tratamento da informação com base em relatórios em formato pdf tem funcionalidades limitadas. Em virtude disso, criamos uma base de dados com ferramenta busca, que viabiliza consultar diversos documentos devidamente filtrados em suas unidades mínimas. Segue um exemplo, para fim de demonstração, de um ambiente no qual foram carregados, o PL, o Estatuto em vigor, bem como o Código Penal:


Tivemos sucesso nessa mobilização de forma bastante ágil, especialmente em razão da nossa experiência na reformulação da Legislação Anotada pelo STF. A maior diferença estava em que o STF buscou conjugar seus próprios julgados com um texto normativo, ao passo que - no interesse da Câmara dos Deputados - o interesse é comparar diferentes textos normativos entre si.

Esse novo escopo é muito mais ambicioso, pois articula textos mais longos e numerosos, além de terem hierarquia e forma bem definidas. Como qualquer ponto pode se ligar a qualquer outro ponto do acervo, o sistema a ser criado deverá ser capaz de criar milhares endereços únicos. Ao final, o projeto deverá ser capaz também de tratar diversas versões de um mesmo texto normativo, além de criar vínculos dentro de diversos pontos de uma mesma norma.

A funcionalidade que viabiliza a criação de vínculos dessa de natureza demandou o desenvolvimento de um gerador de endereços únicos para cada fragmento, o que não é tarefa simples por si só. Tal etapa foi cumprida com sucesso. E agora, com a viabilidade do projeto demonstrada, estamos considerando alternativas para a criação e gestão desses vínculos de uma maneira prática.

A captura seguinte ilustra uma possível solução para a copiar o endereço único do fragmento (uma espécie de CEP de cada artigo de lei ou proposição):


Este é o estado atual do projeto: já construímos a plataforma que abriga parte dos textos normativos e validamos o gerador de endereços únicos. O próximo passo consiste em desenvolver uma interface capaz de salvar e exibir os vínculos entre os fragmentos normativos de maneira intuitiva.

Publicaremos num futuro post o avanço dos trabalhos. Alguma sugestão?